Em 1952, a poesia concreta tem seu marco inicial com o lançamento da revista "Noigrandes" Fundada pelos poetas Décio Pignatari, Haroldo da Campos e Augusto de Campos.
Trabalhando de forma integrada o som, a visualidade e o sentido das palavras, a poesia concreta propõe novos modos de fazer poesia, visando a uma " arte geral da palavra"
O concretismo, sem dúvida foi um dos movimentos mais significativos e ricos da nossa literatura. Desconsiderados por boa parte
da imprensa e mesmo da crítica, acusados de fazerem "poesia fria", os
poetas concretos tinham em mente a incorporação do espaço e do avanço na esfera
tecnológica, buscando uma maneira universal de comunicação, na linha de
vanguarda. Com certeza, atingiram seu objetivo e instalaram uma nova percepção
do poema, afinado com o olhar do século XX.
Parece-nos importante salientar alguns aspectos
relevantes dessa nova postura. Em primeiro lugar, a ruptura face ao verso
implica, necessariamente, a desestabilização do lugar do poeta enquanto um
"deus" ou "mito", objeto do culto por trazer a
"palavra bela", capaz de encantar e emocionar. Neste sentido, ao
trazer o signo em estado de pureza, descontextualizado, ele adquire uma
liberdade de significação, resgatando sua historicidade, desde a origem até as
camadas de superposição histórica recebidas. Por outro lado, ele poderá se
deslocar para onde desejar o leitor, sem ter de seguir a trilha traçada pelo
autor: livre das amarras, o signo adquire a consistência de ser, sem
comprometimentos, obrigando o leitor a construir uma consciência portadora de
sentido.
Por conta da ruptura com o verso e a presença do
signo "puro" (numa época de contaminação excessiva, trazida pelos
veículos de comunicação de massa, que trazem a perda de sentido pela
reprodução), fica o leitor na contingência de participar do processo criativo,
dando significação às palavras, já que elas não se oferecem como doadoras. É,
pois, a vivência participativa na esfera da criação que resgata o lugar do
leitor (diferente do "ledor", que se dedica à superficialidade das
coisas ditas, satisfazendo apenas as emoções "epidérmicas") como
aquele capaz de interpretar. Saliente-se, então, a enorme importância do gesto
libertário do poeta, ao abdicar do controle sobre o leitor.
O gesto pressupõe, igualmente, uma postura
política, na medida em que, ao desconstituir a possibilidade de mitificação,
rompe com a ideologia do sistema, que insiste em auratizar a fala literária,
endeusando o artista. Ao fazê-lo, presta um desserviço à arte, na medida em que
cria um bloqueio, impedindo o acesso. Na verdade, o mito é, foi e será sempre
uma fala do poder. À arte, sempre transgressora, cabe a função de profanar,
como o faz o Concretismo, lembrando a parcela dionisíaca da literatura, às
voltas muito mais com o oprimido do que com o opressor. Assim, longe de se
constituir num "mito", ou um "deus", o poeta se torna um
homem como qualquer outro, capaz de dialogar com todos os homens, num gesto de
solidariedade humana (e não "divina").
Ao fazê-lo, o poeta concreto resgata o sentido original da lírica, como aquela
que fala do desejo. Ao expor a falta, é gerada a necessidade de completude (a
fala do leitor),
tornando-se tanto mais desejada porque capaz de seduzir (lembremos ser a
sedução própria do feminino, ficando a parcela masculina com o discurso do poder).
A poesia, por ser feminina, é ambígua, pressupondo necessariamente o diálogo, a
dialética. Instala-se, portanto, a percepção do outro como diferença e
completude, um jogo de morte/vida: morte, porque o "outro" é sempre a
anulação do "eu"; vida porque o "eu" precisa da diferença
para ser.
Neste momento, parece necessário salientar a incorporação da espacialidade ao
poema. Numa época em que se constrói um olhar ex-cêntrico (deslocado para a
mundaneidade), desatento pelo bombardeio feérico das tagarelices, vazias e
imperativas na ânsia de persuasão (nada melhor que os meios de comunicação de
massa para metaforizarem concretamente esta constatação), o signo espacializado
numa página de papel obriga o leitor a redimensionar o olhar e a ouvir o
silêncio.
Por Ana Sousa
Muito interessante conhecer.
ResponderExcluirAmo este assunto,tema do meu tcc
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